domingo, 6 de julho de 2008

Mulheres Parte I

Muito cedo na minha vida foi tarde de mais. Aos dezoito anos era já tarde demais. Entre os dezoito e os vinte um anos o meu rosto partiu numa direcção imprevista. Aos dezoito anos envelheci. Não sei se é assim com toda a gente, nunca perguntei. Parece-me ter ouvido falar dessa aceleração do tempo que nos fere por vezes quando atravessamos as idades mais jovens, mais celebradas da vida. Este envelhecimento foi brutal. Eu o vi apoderar-se dos meus traços um a um, alterar a relação que havia entre eles, tornar os olhos maiores, o olhar mais penetrante, a boca mais definitiva, marcar a fronte de fendas profundas. Em vez de me assustar, vi operar-se este envelhecimento do meu rosto com o interesse que teria, por exemplo, pelo desenrolar de uma leitura. Sabia também que não me enganava, que um dia ele abrandaria e retomaria o seu curso normal. Muitas vezes me disseram que o sol era demasiado forte durante toda a infância. Mas não acreditei.


Já sei muito. Sei uma coisa. Sei que não são os vestidos que fazem as mulheres mais ou menos bonitas, nem os cuidados de beleza, nem o preço dos cremes, nem a raridade, o preço dos enfeites. Sei que o problema está em algum lugar. Não sei onde. Sei só que não está onde as mulheres julgam. Olho as mulheres. Existem as muito belas, muito brancas, têm um cuidado extremo com a sua beleza. Não fazem nada, guardam-se apenas, guardam-se para o Tempo, ou os amantes, o verão que chegará. Esperam. Vestem-se para nada. Olham-se. Na sombra dessas vivendas, olham-se para mais tarde, julgam viver um romance, têm já longos armários cheios de roupas a que não sabem que fazer, colecionados como o tempo, a longa sequência dos dias de espera. Algumas ficam loucas. Algumas são trocadas por uma jovem criada que se cala. Abandonadas. Ouve-se esta palavra atingi-las, o barulho que faz, o barulho da bofetada que ele dá. Algumas matam-se. Esta falta das mulheres a si próprias, por si próprias perpetrada, apareceu-se sempre como um erro. Não havia que atrair o desejo. Ele estava naquela que o provocava ou não existia. Ou estava lá desde o primeiro olhar ou então nunca existira. Era a inteligência imediata da relação de sexualidade ou então não era nada. Isso eu já sei.



deve existir uma outra noite onde caibamos todos inocentemente felizes comendo laranjas e discutindo problemas de aromas de flores